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Decepada e Cabriolante!

A Lenda da Perna Cabeluda

Os aspectos envolvendo essa lenda surgiram em meados da década de 70, quando começaram a surgir relatos de pessoas dizendo que foram atacadas por uma suposta criatura extremamente grotesca e diferente de qualquer coisa que você já viu - uma perna... sim... um simples membro do que chamamos de corpo-humano, perambulava as ruas de Pernambuco durante as madrugadas, e acertava inconvenientes noturnos com uma rasteira, continuando à surrá-los mesmo já estando caídos e indefesos... bom, pelo menos é isso o que as pessoas diziam.

Uma Tentativa de Produzir uma Matéria

Mas afinal, trata-se de uma farsa? Bem, para isso precisamos analisar com calma, pois esta história possui dois lados: uma que envolve o repórter Jota Ferreira que alega firmemente ser o dono dessa matéria inventada para ganhar repercussão na rádio, e há também uma outra pequena história envolvendo um rapaz conhecido como Raimundo Carrero, um jornalista do Recife e autor de obras literárias premiadas, que trabalhava no Diário de Pernambuco. 

Raimundo alega que um companheiro de redação chegou afoito ao trabalho durante uma certa noite e dizia ter avistado uma criatura embaixo da cama que dividia com a sua esposa - uma perna cabeluda.

  • “Mas e o tronco?”, indagaram os amigos.
  • “Não tinha”, respondeu.

De acordo com Raimundo, os jornalistas da época eram boêmios e gostavam de contar histórias mirabolantes uns para os outros, poderia tratar-se de uma piada desde o começo. Por mais estranho que pareça o relato parece ter ganhado notoriedade com um empurrão de um regime político da época.

  • “Como vivíamos sob a ditadura militar e muito conteúdo não podia ser publicado devido à censura, o então editor do Diário de Pernambuco, e hoje ministro do Superior Tribunal de Justiça; Og Marques Fernandes, incumbiu a mim uma coluna policial com casos tido como absurdos. Surgiu aí a história da Perna Cabeluda”, disse Raimundo em entrevista para Aventuras na História.

Sendo assim, a repercussão acabou tornando-se algo mais popular ao ser alvo de matérias um dia depois em programas radiofônicos. Pessoas machucadas, eventualmente com ossos quebrados apareceram dizendo ter sido atacadas pelo membro que agia de forma totalmente autônoma. Portanto, o outro lado da história aponta Jota Ferreira que foi o repórter responsável por disseminar a lenda urbana, ele admite que a história nada mais era que uma brincadeira de mal-gosto que teria sido inventada por ele pelo simples fato de não haver matérias para o jornal.

Abaixo você pode conferir o vídeo:

JOTA_FERREIRA_O_DIA_EM_QUE_INVENTEI_A_PERNA_CABELUDA

JOTA FERREIRA O DIA EM QUE INVENTEI A PERNA CABELUDA

[Jota Ferreira] O dia em que inventei a Perna Cabeluda

Habilidades

  • Força Descomunal - É admissível considerar isto diante da capacidade que um membro poderia ter pra derrubar uma pessoa.

HQ

Em 2015, a lenda urbana ganhou uma versão em HQ com 28 páginas. Sendo intitulado como "A Rasteira da Perna Cabeluda", foi publicado pelas Edições Bagaço e produzido por André Balaio.

Balaio, que já foi responsável por produzir outros contos de horror, desta vez criou a trama a partir de uma especulação: "O que aconteceria se a Perna Cabeluda voltasse a atormentar os viventes nos dias de hoje?": Em meio ao clima sobrenatural da narrativa, o autor retrata aspectos como o preconceito, a ambição e o desejo de vingança.

O_Recife_Assombrado_A_Perna_Cabeluda-0

O Recife Assombrado A Perna Cabeluda-0

Algumas coisas não se encaixam aqui...

Essa história envolvendo a Perna Cabeluda é muito confusa, o simples fato de haver uma enorme confusão envolvendo o seu surgimento já é o suficiente pra perturbar qualquer um que seja perito em analisar as origens de uma lenda urbana, qué dizer, se Ferreira inventou a história, porque raios o Raimundo alegou em uma outra entrevista que isso chegou em seu consentimento através de um companheiro de redação, e que só depois disso tornaria-se viral, pelo fato dele mesmo ter publicado?

O mais estranho é que Raimundo afirmou em sua entrevista para a AH, que essa história teria surgido a partir de uma papelada entregue à ele por um dos ministros, sendo assim, se houvesse alguma outra hipótese, eu poderia até dizer que Raimundo poderia ser chefe de Ferreira, mas não faria sentido algum, pois Ferreira disse que ele mesmo havia inventado essa história justamente para o superior dele, e além disso, como diabos ela já estaria documentada em uma coluna de casos policiais, antes, de Ferreira supostamente ter inventado tudo isso?

Ou então, será que Ferreira não estaria contando tudo com clareza? A verdade é que muitas coisas não fazem sentido nessa história, Ferreira também diz em seu vídeo que teria publicado isso no final dos Anos 70, o que contradiz o fato de Raimundo ter publicado sua obra em 76, além de ser evidente que no vídeo em que André Balaio fala sobre sua HQ, em um momento podemos notar que havia um jornal de 1975 que já retratava este assunto, o que contradiz Raimundo, pois ele só viria à publicar sua obra apenas um ano depois, sinceramente de uma coisa eu tenho certeza, há muitas lacunas para preencher nesta história envolvendo a Perna Cabeluda.

Assimilações com o Bicho Papão

Uma coisa muito estranha é que essas pessoas de hoje em dia alegam que as crianças daquela época costumavam olhar embaixo da cama antes de dormir, pois achavam que essa Perna Cabeluda poderia estar espreitando por ali - caso haja um fundo de verdade na história de Raimundo Carrero, as circunstâncias envolvendo as crianças olhando embaixo da cama pode ser curiosamente associada com o primeiro relato envolvendo a Perna Cabeluda, o que só tornaria as coisas ainda mais assustadoras.

Tulpa?

Enfim, tudo isso é muito estranho, se eu fosse louco o suficiente pra querer fantasiar isto, eu diria que poderia tratar-se de um Tulpa, que pra quem não sabe é uma criatura presente no Folclore Tibetano, sendo criada pelo próprio pensamento humano, através de energias que alimentam uma ideia, e com o tempo, algo inexistente cria uma vida própria, mas essa hipótese seria extremamente absurda, creio que seria absurda até mesmo para aquelas pessoas que tem uma crença profunda neste conceito, pois uma coisa é uma criança de 5 anos com uma mente fértil ter um Amigo Imaginário, outra coisa é algum jornalista de 30 anos de idade, querer canalizar átomos através da Lei da Atração para energizar algo que viria à criar vida própria, e sendo tão exorbitante a ponto de tornar-se algo físico que sai perambulando por aí durante a madrugada.

A Obra de Ficção

Abaixo você pode conferir a obra literária escrita por Raimundo Carrero em 1° de Fevereiro de 1976:

"O repórter apressado, nervoso, entrou na redação do jornal. Colocou o papel na máquina, mas estava de tal forma agitado que não sabia como escrever. Percebendo sua indecisão, o editor procurou saber o que estava acontecendo. Gago, voz presa na garganta, precisou de alguns segundos, ainda, para ordenar as palavras. “A perna cabeluda está em Olinda”, disse, esperando a reação do chefe. Uma pessoa fora agredida, levara três pernadas no pescoço, uma na barriga, sangrando fora socorrida por populares e estava, agora, no Hospital da Restauração. E não fora a única. Invadira também a residência de uma bela moça, não respeitara pai nem mãe, com uma rasteira derrubou-a, ali mesmo, no meio da sala, diante dos olhos estarrecidos da família, que não sabia como reagir, praticou agressões.

Foi um corre-corre na rua, gente chamando a polícia, mulher chorando abraçada com o marido, irmãos e parentes, as mais piedosas e religiosas rezando nos pés dos santuários. A pobre moça, coitada, gemia, gritava, pedia proteção. Não era fácil, no entanto, agarrar a perna. Ágil, saltava para todos os lados. Teve um rapaz, herói anônimo, que ainda pulou a janela da residência, mas nada pôde fazer porque logo recebeu uma violenta pernada na cabeça, caiu sangrando, batendo, quase morto. A perna cabeluda somente se deu por vencida quando foi escutado o gemido do carro da polícia. Saiu correndo pela porta dos fundos, meteu-se numa rua estreita, atravessou um beco e desapareceu num matagal. Os homens da rua, penalizados com o choro da moça, formaram logo uma “coluna”, armaram-se de facas, revólveres, pedaços de paus, saíram em sua perseguição. Nessa hora os policiais já vinham chegando.

Juntaram-se aos guerreiros, saíram em busca da perna criminosa. Foi que um guerreiro mais afoito, que corria na frente de todos, armado com um revólver, uma peixeira e um canivete, deu grito, caiu sangrando, o corpo todo dolorido. No escuro, não pôde ver a perna cabeluda escondida atrás de uma moita. Vingativa, não apenas deu-lhe uma rasteira, como chutou sua boca e ficou pulando sobre seu peito. Os outros homens correram em seu socorro, mas havia a surpresa: confundindo-se com a escuridão, a perna pulava mais do que o Saci Pererê, agilíssima, de um lado para o outro, cai aqui, cai acolá, “ela está aqui”, “ela está ali”, um caindo por cima do outro, cabeça lascada, braço quebrado, barriga rasgada. Pior foi quando começou a chover: trovões, relâmpagos, muita água, sangue correndo na lama. Confundindo-se, os guerreiros agrediam-se, esmurravam-se. Um fuzuê dos diabos. Quando a perna decidiu desaparecer, ouviu-se uma gargalhada medonha, três soluços e um arroto.

Derrotados, os guerreiros retornaram para casa, feridos, alguns em macas, os policiais jurando que ela seria presa ainda naquela noite, todo contingente seria acionado, não haveria escapada. Quando entraram na rua iluminada, as mulheres esperando nas janelas – umas chorando, outras conversando agitadas – parecia uma procissão de desgraçados. O socorro foi logo providenciado. Mesmo no carro da polícia, os mais feridos foram conduzidos para o hospital. Parecia o fim do mundo. Correu um boato na rua que era o início do Apocalipse, era preciso começar a rezar com muito fervor, pois uma multidão de estrelas já se precipitava do céu, e uma legião de mortos vestia os seus corpos para sair dos túmulos, cobrando promessas aos vivos. As moças choravam, os rapazes corriam para a igreja, queriam se confessar. Teve cabeludo que raspou o cabelo, afrouxou as calças e vestiu terno. As mulheres cobriam as barriguinhas, encompridavam os vestidos.

Mas foi que a agitação cresceu mais ainda, quando já se imaginava que era chegado o momento de dormir sossegado. Os gritos de uma mulher foram escutados, misturados com uma pancadaria, voz de homem furioso berrando. De repente, a mulher foi atirada na rua, bateu com a testa no chão, quebrou a cabeça. O homem furioso apareceu com um revólver na mão. Foi logo contando: chegara em casa cansado, louco para dormir, e quando entrou no quarto, o que viu? Ao lado da mulher, estava deitada a perna cabeluda, morrendo de rir. Perdeu a paciência, puxou a mulher pelos cabelos, esfregou-a na parede. E a perna gargalhava, dava saltos em cima da cama, dançava samba, rumba e frevo. Insatisfeita, ainda deu-lhe um chute na barriga e saiu correndo. Ninguém mais podia se conformar, era mesmo o fim do mundo. Mesmo os mais afoitos não se decidiam a perseguir a malvada. Socorreram, no entanto, a mulher ferida. Vários carros da polícia apareceram para proteger o povo da rua. Os policiais traziam metralhadoras, canhões, revólveres, gás lacrimogêneo, o diabo. Armaram esquemas, trancaram as ruas, esquinas, vielas. Desistiram, porém, quando surgiu a notícia, ninguém sabe quem deu: a perna cabeluda estava pintando o diabo em Boa Viagem."

Observações

  • Não está muito claro a origem desta história.
  • Não é uma história rica em detalhes.
  • Infelizmente a violência doméstica pode ter ajudado a intensificar a repercussão dessa lenda, até porque não seria difícil imaginar uma situação onde uma pobre moça é agredida por um marido folgado e sente-se obrigada à atribuir o ataque à uma criatura desconhecida por se sentir ameaçada. É até seguro dizer que a Síndrome de Estocolmo pode está relacionada com alguns destes supostos ataques.
  • De qualquer maneira, é melhor evitar ficar perambulando pelas ruas de Pernambuco durante plenas madrugadas, não devido à fatores sobrenaturais, mas sim devido à fatores que são realmente perigosos; os humanos.
  • Parece que o Saci Pererê vai precisar de uma passagem pra Pernambuco afim de buscar sua outra perna.

Fontes de Pesquisa

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